domingo, 19 de janeiro de 2014

FotoJosé Luis Almeida Albuquerque.

- Aproxima-se a noite e eu contemplo o céu, a imensidão do mundo, e tantas tempestades adormecidas neste céu rasgado de magia. Os temporais acalmaram o desejo, apenas percorro a via-sacra da vida, para que dela renasça mais forte e mais serena.

- Impetuoso o gesto perecido no além. Mereceu tudo e nada lhe foi doado, a não ser dor da partida sem conhecer a verdade do aquém. Rompe as nuvens com desdém e alcança o mar acetinado, onde a partida já foi chegada. O dia já nasceu e na noite nascerá o dia. Percorre todos os trilhos das baixas marés, em absoluto silêncio. Ouve-se agora o som eterno da alvorada.

- Encosto-me ao parapeito do tempo. O meu corpo abriga-se nas encostas e a alma cede ao desejo de mudança. Os cansaços dissipam-se nesta grandeza infinita e as vozes calam-se quando a brisa do vento me acaricia o rosto.

- Correm rios no teu corpo. Descansa agora, enquanto o sono não vem. Já o toque às almas aconteceu quando o sol se pôs. Nada se afigura distante. Só o universo é grato pela luminosidade crescente em cada corrente que trespassa o véu que te enlaça.
- Voluntário o desejo de transformação que se aninha nas dobras dos dias. Invento e reinvento amanhãs promissores. A vida decorre sempre entre as madrugadas e as noites que se consomem pausadamente, sem pressas.

- Se todas as manhãs fossem só tuas, serias o tempo de mudança a madrugar nos teus olhos. Mas quem sou eu, se não uma força a caminhar contra o tempo? Se conseguíssemos acomodar o tempo no nosso pequeno mundo, já teríamos dado graças a Deus por termos em nossas mãos, o mundo.

-A paz como alimento das noites, é o consolo que ainda me resta neste tempo incerto. Na minha pequenez colho do tempo o que ele tem de mais belo para me oferecer. Nem sempre me afasto das sombras, nem sempre me protejo dos temporais. O céu ora se tinge de negro, ora se aclara de luz.

- E nesse meio tempo, as luzes se acendem em todos becos onde te escondes. Será sempre um dia ou uma noite a
menos nos nossos sonhos. Sabias de um tempo em que se colhiam orquídeas brancas nos matagais?

- Nesta encosta acompanho os movimentos que
transcendem o espaço e por vezes se elevam acima das luzes frágeis da cidade. E apenas as clareiras que se avistam
num horizonte a perder de vista, me trazem a luz tão desejada nas noites de procura.

- Existem credos em todas as orações. Crer num espaço
inédito, e criar nele um campo de visão obrigatória para lá, é ter fé na nossa fé. A minha cidade sabe de todos os becos
escuros e sombrios, e eu nada sei da cidade. Só vejo daqui as luzes ainda reflectidas nas águas do Tejo.

São Gonçalves / Epifânia

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