domingo, 22 de novembro de 2015

Carrega - se os dias e as noites aos ombros 
A imensidão do mundo 
Carrega - se a força e a fraqueza 
A luta diária de mangas arregaçadas. 

São Gonçalves.
Acolho no regaço todos os cansaços, todos os abraços. 
O reverso e o verso 
O começo e o fim.
Acolho a dor e a ternura 
A palavra e o silêncio. .

Acolho no regaço a transformação da noite, do dia
Das palavras
Metamorfose em poesia.

São Gonçalves.

Para onde devo olhar?
Para o negro do caminho, desbotado das intempéries, dos mil passos apressados dos homens?
Para o céu tingido de castanho
Dessa mágica luz outonal?

Olho para mundo na beleza transcendente
Esse cruzar de olhares e de vozes

O chiar do carro no asfalto
O cântico da cigarra
Serpenteando os canais que percorrem o coração das cidades .

Olho o horizonte marmorizado
De cores amenas
Para esse apaziguador crepúsculo
Essa hora onde o sagrado e o profano se unem
Na beleza do silêncio
De um fim de tarde
Solicitando a paz do corpo e do espírito.

São Gonçalves.
Fotografia - Camilo.
Planto palavras numa terra que não me pertence, e mesmo assim, agarro com as duas mãos os sítios por onde me perco. 
O céu , a terra, o mar, 
O mundo todo numa encruzilhada de dores e cansaços, 
E a poesia dos dias 
E a alma ali a a impor -se no segredo das horas vazias. 
Há dias assim
Dias em que as palavras me fogem, dolorosamente por entre o silêncio e a vigília da noite.
E eu pergunto
Será isto poesia?

São Gonçalves

Foto -Dasha Friedlova

domingo, 15 de novembro de 2015

É tão singular o mundo onde habito, o mundo onde evoluem os meus sonhos, os paradigmas de toda a existência. 

Pensamos ter chegado a hora certa, o minuto, o segundo onde tudo se aquieta e renascemos na fragilidade dos dias. Mas tudo se complica, os obstáculos não mudam de lugar, as dificuldades repetem - se numa cadência assustadora. 
E a coragem continua a ser o alimento que devoramos nas noites de insónia. 
São Gonçalves. 

Foto. Rosa Mouzinho Santos 
Tudo é efémero 
As minhas palavras que pouco valem 
Este sentimento de querer o desapego 
A libertação de tanto mar, de tanto céu , dentro de mim.
Este infindável terramoto no meu meu peito, anunciadas tempestades, e o sol, e o vento, o mágico lusco -fusco a entrar -me pelos sentidos, procurando um local de abrigo 

Tudo é efémero, o meu corpo ensaiando gestos de ternura no teu, o esboço de um poema que nunca se escreveu.

A minha alma ferida de silêncios. ...
Efémero o mundo que nos perdeu.

São Gonçalves.

Foto - Dila Sá.
Contra ventos contrários e marés adversas, caminho
Sou a força solitária dos meus passos
A eterna procura do devir num céu de cores claras, os meus olhos sorriem ao mundo, nada me demove de cruzar ventos e marés.
Não faço parte de grandes comunidades, nem sou figura presente nas festas mundanas .
O meu destino é a solidão das palavras, um mundo de tantos silêncios gritantes. 

Eu sou parte deste céu, deste vento
Deste marear de sentidos e de medos.

São Gonçalves.
Foto - António Mattozzi.
No silêncio dos meus passos 
Há um mar a segredar o mundo
Abismo de vidas em suspenso 
Nas brumas de uma manhã fria 

Caminho rente ao mar
Oiço os segredos
É tudo tão imenso
Tão dolorosamente profundo

O mundo é tão pequeno
Nesta imensidão
Que eu abraço devagar
Tão misteriosamente lenta
A dor que me chega
No canto das gaivotas
No marulhar do oceano

Caminho, não sinto o corpo
Nem os passos
O toque da areia fria nos
Meus pés

Nada posso fazer
Escuto apenas
O bramir do oceano

São Gonçalves.
Só assim vale a pena
Olhar-te na margem
No silêncio de uma margem esquecida
Figura presente num rio
De lembranças
Suspensas de tantas palavras…

Só assim te vejo
Nesse espaço de salgueiros viçosos
Nesse sol macio de primavera
Nesse céu de nuvens brancas, sedosas
Vagueando num espaço aberto….

Só assim permaneces
Nesse tempo e nesse espaço
Juncado de outono e de sons de verão
De memória…

São Gonçalves

Foto-Camilo Rego
Que me diz o vento do norte
Quando espreito 
À janela do meu olhar?

Fala-me de mãos que se tocam
Em silêncio
De uma amizade eterna

Fala-me das noites
Onde ainda me visitas
Da nostalgia de não te poder abraçar…

Que me diz o vento do norte
Dos dias tão iguais
Ou a sombra de um rosto a descoberto

Diz-me da fragilidade do tempo
Dos afetos arrastados
Nos trilhos do vento

De uma caricia de um beijo
A memória de um desejo.

São Gonçalves
Não há palavras !
Apenas silêncio !
Não trago no peito o peso do ódio dos homens , nem a fé dos que matam sem piedade, não conheço o dicionário das palavras negras, amargas,
Mesmo assim 
Não são de ternura os meus pensamentos.
Os meus filhos questionam - me
Inquietos
Procuram respostas para entender a barbárie, não vejo no seu olhar a sombra do pânico
Clamam respostas para um mundo à deriva, sangrento.
São de sombras os meus silêncios
O pranto jorrando das minhas mãos, a visibilidade de uma inquietude silente
A incompreensão
A falta de entendimento do mundo
Dos homens
São de silêncio os meus dias
E de sombras as minhas noites.
São Gonçalves.

domingo, 8 de novembro de 2015

Tanta luz, tanta vida.

É sempre ao fim da tarde que te espreito
Nessa placidez eloquente
Da terra agreste nua
Do interior da casa escuto o murmúrio do rio
O canto melodioso dos pássaros
A volúpia magia das árvores
Esquecidas no monte.

Sei que vejo passar no meu corpo as estações
Os meus cabelos embranquecem
O meu rosto encerra a sabedoria dos anos

O olhar meigo permanece brilhante e curioso
É com esse olhar que sinto
Serra minha, tão silenciosa e minha
O verde das árvores e dos anos
O decalque dos afagos nos tetos das casas

São de luz os meus olhos quando te espreito
Nesta janela virada à vida!

São Gonçalves

Foto-Ana Souto Matos.
Um poema azul!

Guardo nas asas do vento
A paz de um azul cobalto
O vazio da arvore despida
Galaxias girando
Ao redor da terra
Do meu mundo ainda agreste
Realizo que nada foi em vão
Nem os dias
Nem as noites
Nem os sonhos de um azul apaziguador
Guardo nas asas do vento
O beijo do colibri
O toque suave das tuas mãos
O prenuncio de alvoradas macias
Eternas
A dignidade de uma arvore solitaria
Atrevassando as estações
Guardo a imensidão da palavra
Codigo de promessas
Azuis !

São Gonçalves.
Quando eu despertar dos medos
Da fobia das cores cinzentas.

Quando eu deixar 
Deslizar na epiderme 
O sal das vagas
O contorno da perolas
Ali se embriagar de ternura
No segredo do teu ventre
Imaculado!

Quando eu deslizar mansamente
No ventre infinito
Na calidez do teu abraço
E acordar renovada
Das frustrações da vida
Na maciez do teu
Regaço!

Quando eu te encontrar
Alma refeita na passagem das horas
Contemplarei o mundo
Com olhar de espanto
Um foco de luz
Disperso no olhar
Iluminado!

São Gonçalves.

TelaEdite Melo - Contemporary Art

Participação na Antologia, El club des las poetisas

Tradução da poetisa Argentina, Cecilia Ce Ortiz.

Cuando despierto de mis miedos
y la fobia de los colores cenicientos cuando dejo
deslizar por mi piel
las sal de las ….
el contorno de las perlas
allí se embriaga de ternura
el secreto de tu vientre
inmaculado!
Cuando me deslizo mansamente
en el vientre infinito
en el calor de tu abrazo
y despierto renovada
de las frustraciones de la vida
en la suavidad de tu
regazo!
Cuando te encuentre
rehecho en las horas del alma
contemplaré el mundo
con una mirada de asombro
y un foco de luz
disperso en la mirada
iluminado!

São Gonçalves.
Luxemburgo.
Sento-me à margem do tempo
numa contemplação outonal,
tardia...

desejos de encontrar o sentido
das coisas perfeitas
profundas..

Num mundo pleno de desassossego
invejas,guerras, povos desavindos
escuridão

por momentos apenas olho para dentro
para o coração da terra
mãe

ai, encontro o verdadeiro sentido
o desapego das coisas inúteis
imensidão

num rasgo de silencio
busco o sentido da vida
maravilhada

o tempo é o construtor
a dádiva divina da existência
encontro

a resignação do momento presente
a fugaz margem do devir,permanente
busca.

São Gonçalves.
Não há estranheza nas sombras da tarde, apenas a complexidade da luz exala um perfume de paz. 
Não há escuridão sem a presença da luz, essa dicotomia de almas inquietas. 
Até a cidade brilha quando a claridade a abraço num abraço silente, pejado de ternura. 

São Gonçalves. 

Foto - António Mattozi
Frágil a melodia do tempo
o sentido magico
a maciez da flor
acariciando as cordas

ébrio o sentir
o som vibrante do mundo

catarse de infames memorias
a tua voz
o teu ritmo
a tua sensibilidade musical

Tocam-se violinos
sentem-se os odores florais
e a musica inunda
a passagem das horas.

sensíveis os sons musicais
tactos de luz
na vastidão plena
de uma vida.

São Gonçalves.

Foto-Camilo Rego
Onde ficou a alma da casa?
Os sons das crianças
Alegres
Os gemidos de amor
Na plenitude dos dias
E das noites!
Quando foi que te roubaram a vida?
A luz
O encanto da mesa cheia
A celebração dos ritos!

Quando foi que te votaram ao silencio?
E te abandonaram
Ào sombrio esquecimento
Dos anos
Na passagem das estacões
Inclementes e impiedosas!

Quando foi que te roubaram a vida?

São Gonçalves.

Foto-Dolores Marques
Não são só de pedras e de arquitecturas ancestrais pelas quais olhamos os dias. 
Há na vigília das vésperas um olhar novo, uma cor de outono a perfumar os desejos e os ensejos .
Há um mar dourado a brilhar na transformação dos passos. 
Há a transição das luas num equinócio ausente. 
Há um espelho de luz a iluminar as trevas. 

São Gonçalves.
Foto - António Mattozzi
Saber quem está connosco é saber de um mundo quase sempre invisível a olho nu. 
É saber de sensibilidades e de subtilidades escondidas muitas vezes num céu sem ausência de nuvens sombrias. 
Mas saber que estão sempre na luz que ilumina no crepúsculo. 

São Gonçalves.
Quanta simplicidade e quanta beleza quando a fragilidade e subtilidade se impõe à rudeza e à amargura existencial . 
Quanta força há na ilusão do encantamento. 

São Gonçalves.
Aqui na solidão da casa 
Já não te espero 
Visitas -me sempre 
Nas noites claras 
És a companheira silente 
O son das palavras
Escritas
Nas entrelinhas de um poema
Um livro virgem
Esperando ser lido
És o silencioso cântico
Das aves migratórias
Esperando a estação do estio.

És a estrela brilhante
Num céu de murmúrios
A memória guardada
Nos gestos simple e eternos.

São Gonçalves.
Esmaecida a tarde alonga -se no leito do mar
O sol desce lentamente
Sangrando as dores do mundo 
Esquecido do calor da tarde 
Reflexos das sangrentas 
Lágrimas

Há uma cigarra que canta
Uma gaivota que voa

Tão negras as grades
Portas semi abertas ao mundo
Dos homens

O sol que parte na sua sangrenta
Visão do mundo
O cântico da cigarra
Se esvanece no murmurar das vagas

E o mundo acorda no dia seguinte
Fechado dentro
Das grades negras
E imóveis.

Apenas fica o a beleza do silêncio entre o canto da cigarra
O murmúrio das vagas
E os espaços abertos das grades
Viradas para o mar.

São Gonçalves.

Foto - António Mattozzi .
Existe uma certa distância entre o mundo e eu , um silêncio que venero, um poema ainda por escrever. 
Há um certo mistério nisto tudo, neste encantamento ilusório. 
Um voto de confiança ao meu mundo interior e misterioso. 
Uma vaga de água salgada a beijar -me o rosto . 
Um dia vivido e tantos outros esperando as madrugadas. 
Um corpo esperando o porvir sem ânsia de o alcançar.

São Gonçalves.

domingo, 1 de novembro de 2015

Partem as mães de madrugada, partem com a neblina fria que flutua no ar
Esse fio de solidão planando no ar
Deixando a casa e o colo desabitado
Levam com elas a ternura e a memória
O caudal das lembranças correndo na represa dos olhos
Os cheiros a alfazema e alecrim
O ondear das vagas no peito
Agitado das noites sombrias e tristes.

Partem as mães de madrugada, partem com as dores do parto
Essa dor fina que antecede a luz
O corte do cordão sangrando na pele, na alma
O sangue correndo nos poros
Na dor dilacerante da ausência.

Partem as mães de madrugada, e o silêncio é agora
A cor das vestes com que se cobre o corpo.