Em todas as madrugadas o beijo da luz a quebrar o silêncio da noite. Deste lado do rio contemplo a cidade e o lençol de águas paradas. Pergunto de que sonhos são feitos os dias dos homens?
De que sonhos?
Vi passar por mim os dias, os anos, os séculos! Vi as crianças tornarem -se homens. A alegria transformar-se em tristeza, depois em dor. O riso livre, num trejeito minguado nos cantos da boca.
Vi a passagem de sóis e de luas.
Crianças sujas, mirradas pela fome e pela solidão!
Olhei a minha solidão e a solidão dos que se deitavam nestas águas pardas.
Vi o espelho do teu rosto nas noites em que de longe vigiava os teus temores!
Vi o mundo transformar-se, os homens perderem - se!
E no fim eu e os homens consumamos os mesmos desígnios.
O tempo de iluminar a escuridão dos outros, e o tempo de iluminar a nossa própria solidão.
Eu e os homens vigiando a cidade e o lençol de águas paradas.
Vigiando os dias e as noites!
A recompensa e a perda!
São Gonçalves.
Foto -Edite Melo.
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